A Inteligência é um apanágio dos nobres. Confiada a outros, desmorona.
Walter Nicolai (1873-1934),
Chefe do Serviço de Inteligência da Alemanha
durante I Guerra Mundial
Faltam 7 dias para meus 40 anos! E, certamente, nestas crônicas sobre as primeiras 4 décadas da presente encarnação, lugar de destaque é o da minha passagem pela Agência Brasileira de Inteligência (ABIN). O tempo em que fiquei naquela Casa aprendi muito, amadureci profissionalmente, fiz grandes e sinceros amigos, fui inteiramente contaminado pelo vírus da Inteligência (entenda-se aqui informações)! E descobri que, uma vez com esse maravilhoso vírus na corrente sanguínea, impossível se dissociar dele!
Ingressei no “Serviço” (como alguns ainda o chamam) por concurso público. Apesar das críticas, no Brasil, felizmente, deve-se prestar concurso para se ingressar na ABIN. Que bom, pois se não fosse assim, jamais teria me tornado analista de informações – hoje oficial de inteligência! Quando me perguntam sobre concurso para a inteligência, muitas vezes em tom jocoso, rebato logo assinalando que a obrigatoriedade do concurso público foi uma das grandes conquistas da Constituição de 1988, e que não conheço carreira pública, civil ou militar, em que se ingresse de maneira distinta à da via meritocrática. Entendo que concurso para a ABIN é algo tremendamente válido, e deve ser mantido, pelo bem da democracia e do próprio serviço de inteligência. Claro que, fundamental, é que haja critérios adequados e bem estabelecidos para o referido processo seletivo.
Por óbvio, não contarei aqui o que fazia no serviço secreto. Mas o que posso destacar do período é que fiz descobertas muito interessantes. Primeiramente, descobri que Inteligência e democracia são plenamente compatíveis – não existe democracia no mundo que possa prescindir de seus sistemas de inteligência, uma vez que esses têm grande importância no assessoramento do processo decisório e na proteção ao conhecimento precioso.
Também aprendi que a nossa é a segunda profissão mais antiga do mundo. A atividade de inteligência surge com a necessidade dos primeiros chefes tribais de conhecer sobre as outras comunidades, de saber quantos guerreiros tinha a tribo vizinha, se eram caçadores ou coletores, quantas mulheres havia naquela comunidade. Esteve presente nos últimos 20 mil anos da história da humanidade e, acredito sinceramente, enquanto houver seres humanos sobre a face da terra, haverá serviços de inteligência. Portanto, é importante que pessoas, grupos, organizações e governos aceitem essa realidade.
Aprendi, ainda, o quanto a inteligência é importante para prevenir contra ameaças e identificar oportunidades. E descobri, entre a comunidade de inteligência brasileira (tanto na ABIN quanto em outras organizações que tive a oportunidade de conhecer), profissionais altamente competentes, qualificados e, acima de tudo, comprometidos com os interesses nacionais e com a defesa do Estado e da sociedade. Sim! Ao contrário do que tentam apregoar os críticos de nossa comunidade de inteligência (que o fazem por desconhecimento, preconceito, ou mesmo má-fé), nos nossos serviços secretos a grande maioria dos profissionais é composta de mulheres e homens bons, de caráter, éticos, apaixonados pelo que fazem, enfim, servidores públicos com “s” maiúsculo. Respeito imensamente esses profissionais, tenho grandes amigos na comunidade de inteligência, repito, e almejo vê-los mais valorizados tanto pela sociedade quanto pelas autoridades públicas – seus “clientes” principais.
Nos meus primeiros quarenta anos de existência, a experiência no serviço de inteligência serviu para que me apaixonasse por esse campo da atividade humana, e para que dedicasse minha vida profissional e acadêmica a conhecer melhor esse fantástico universo. Ainda tenho muito o que aprender sobre Inteligência, e pretendo dedicar minhas próximas quatro décadas a esse fim. É um campo fascinante, sedutor, e rico em lições para a vida!
Deixo meu abraço fraterno a todos da comunidade de inteligência. Dia 7 de dezembro, véspera de meu aniversário, é o dia do profissional de inteligência. A própria Lei nº 9.883, de 1999, que institui o Sistema Brasileiro de Inteligência e cria a ABIN, foi publicada no Diário Oficial da União no dia de meu aniversário.
Espero, sinceramente, que nos próximos anos, nossas autoridades públicas e o conjunto da sociedade brasileira passem a valorizar mais essa atividade tão imprescindível para o Estado, a sociedade e a democracia, bem como a seus profissionais, os abnegados homens e mulheres que operam no silêncio!