A Voz de Deus

15.08.1945. Nesse dia, milhões de japoneses ouviram, pela primeira vez, a Voz de Deus. Exatamente às 12:00h, horário de Tóquio, começava a transmissão radiofônica do discurso de Hirohito, o 124º Imperador do Japão, anunciando o fim da Guerra no Pacífico. O país aceitava os termos da rendição incondicional que lhes haviam sido apresentados pelos aliados. Estava-se diante de um acontecimento histórico sem precedentes.

800px-Emperor_ShowaImagino como aquilo deve ter marcado os súditos daquele homem, por todos considerado um deus na terra. Hirohito, o Sagrado Imperador, falou. E as palavras do homem-deus anunciavam não só o fim do maior conflito em que seu país já se envolvera, mas também uma mudança radical na maneira como os japoneses percebiam o mundo e a si mesmos. Sim! O Imperador falou. Hirohito era humano! Uma nova era começaria.

Pouca gente tem noção disso, mas a II Guerra Mundial começou para o Japão bem antes de setembro de 1939. Em 1931, os japoneses invadiram a Manchúria, onde criariam um Estado-fantoche governado pelo último imperador da China. Alguns anos depois, em 1937, teria início formalmente a chamada II Guerra Sino-Japonesa, que acabaria se mesclando com o conflito de 1939-1945. 

Assim, territórios seriam conquistados, povos subjugados, milhões de seres humanos escravizados, agredidos e mortos pela máquina de guerra japonesa. Potências tradicionais, como Grã-Bretanha e França, seriam humilhadas no Extremo Oriente pelos eficientes japoneses. Em pouco tempo, a expansão na Ásia e no Pacífico, essencial para os interesses econômicos e militares nipônicos, transformaria uma parcela significativa da região em dos territórios sob a égide do Império do Sol. O Japão parecia invencível, e sua aliança com a poderosa Alemanha acabaria levando os dois países a dividirem o mundo entre si.

Entretanto, o 7 de dezembro de 1941 mudaria tudo. Na manhã daquele dia, a frota norte-americana em Pearl Harbor, no Havaí, sofreria um ataque surpresa, resultando em mais de 2.000 mortos. E, assim, o Japão provocara um colosso até então adormecido, e cujas capacidades eram subestimadas pela maioria absoluta do senhores da guerra japoneses. E despertar os EUA, fazendo com que a ira daquela imensa nação se voltasse contra si, foi um erro estratégico que levaria o Japão à humilhante derrota, em agosto de 1945. Nesse ínterim, conflitos intensos, a Marinha japonesa destruída, territórios perdidos, grandes áreas devastadas, fome e miséria, milhões de mortos, cidades arrasadas, entre as quais Tóquio (com bombas de fósforo) e Hiroshima e Nagasaki (nos dois únicos ataques nucleares da História). Quatro anos apocalípticos.

Sim, a derrota, inconcebível aos militares e políticos japoneses alguns anos antes, chegara. E o preço que o Japão teria que pagar seria alto. Muitos acreditavam que isso incluiria (no melhor dos cenários) a deposição do Imperador, e o fim daquela monarquia milenar. Outros tantos, e eram realmente milhões, esperavam a ordem do soberano, a voz de Deus, para cometer suicídio coletivo e, assim, pôr fim à vergonha da derrota – o que também seria um duríssimo golpe nas forças de ocupação norte-americanas. Bastava a ordem do Imperador… Bastava que Deus dissesse o que deveria ser feito.

E Deus falou! E sua voz foi ouvida. Mas as palavras proferidas não foram de morte e destruição. Em seu primeiro pronunciamento à nação, Hirohito conclamou os cem milhões japoneses, seus fiéis súditos, a resignarem-se com a derrota, a aceitarem a ocupação e as novas regras que dela adviriam, a não morrer pela pátria, mas, ao contrário, a viver para a reconstrução de seu país, a recuperar o que fora perdido, e a garantir às novas gerações uma nova era de paz e prosperidade. Hirohito mostrou a seus súditos humildade, dignidade e resiliência. E lhes deu esperança.

Com a voz de Deus, acabava a guerra. A capitulação formal só seria assinada depois, em 2 de setembro de 1945, em uma humilhante cerimônia a bordo do navio de guerra norte-americano USS Missouri. Seguir-se-iam anos de trabalho intenso e obstinado para a reconstrução do Japão – e os disciplinados japoneses teriam êxito, transformando seu país, em algumas décadas, na segunda economia do globo.

Ao contrário dos outros líderes do Eixo, o Imperador do Japão foi (sabiamente) preservado. Hirohito continuou no trono até sua morte, em 1989. Viveria para ver o advento de um novo Japão, moderno, próspero e pacífico, um Japão que seria, para todo o globo, exemplo de resiliência e de progresso, de tecnologia e desenvolvimento, de equilíbrio e ordem.

No fim de sua vida, o Imperador que nascera deus, terminava como homem. Entretanto, aquele homem, cuja estatura de 1,65m contrastava com o 1,83 do General Douglas MacArthur, mostrara-se um gigante, um colosso que teve a coragem e a força para (re)criar uma nação de gigantes.

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Explosões Nucleares

Como a semana começou com minhas preocupações infantis com o fim do mundo por meio de uma hecatombe nuclear, resolvi publicar aqui a referência a um site muito interessante, que simula explosões nucleares em qualquer parte do globo! (Isso mesmo que você leu!)

O site funciona assim: você digita o nome do local que queira mandar pelos ares e define a potência do explosivo – há opções pré-configuradas, como as de Fat Man e Little Boy, as duas bombas lançadas sobre o Japão na Segunda Guerra Mundial, e também da Tsar, a mais poderosa bomba nuclear já criada.

Perimetro de explosao nuclear simulada

Além das configurações básicas para a detonação, é possível simular a expansão radioativa baseada na direção do vento, número de fatalidades e muito mais. E quando estiver conforme você escolheu, basta clicar no botão vermelho e ver os impactos de uma explosão atômica. Eu testei com algumas cidades brasileiras…

Para acessar o site, clique aqui. Mas não se empolgue, por favor!

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O Cogumelo

Foi há 74 anos. 4 anos de guerra para uns. Um único avião. 350 mil pessoas. Uma bomba. 100 mil almas instantaneamente pulverizadas. Um cogumelo. Uma guerra terminada. E o mundo nunca mais seria o mesmo…

Os alemães haviam assinado a rendição incondicional a 8 de maio (9 para os soviéticos). E a Europa via seus destinos serem decididos pelos três grandes em uma mansão na cidade de Potsdam (futuramente publicarei sobre minha visita ao local da Conferência de Potsdam, ocorrida – a Conferência, não minha visita – em julho de 1945). Mas o conflito continuava no Pacífico, pois o Império do Sol Nascente insistia em não se render… Quanto tempo mais os japoneses resistiriam? Quantas semanas para o desembarque dos JI americanos nas principais ilhas japonesas? Quantos morreriam nos combates contra o valoroso povo japonês?

O Presidente Harry Truman deu a seus colegas em Potsdam uma previsão: não haveria desembarque, o Japão se renderia em breve e a guerra logo acabaria. Afinal, em alguns dias o mundo testemunharia a nova arma desenvolvida pelo Projeto Manhattan e que colocaria a humanidade em uma nova era, a era do átomo. Essa arma poria fim à guerra e o Japão se renderia. 

Assim, às 8:15 da manhã daquele 6 de agosto, os cidadãos de Hiroshima encontraram seu destino: do único avião que fora avistado, o Enola Gay, apenas uma bomba foi lançada. Então, um clarão imenso, capaz de ser visto do continente, foi seguido de um enorme estrondo e de uma explosão, cuja onda de choque destruiu praticamente tudo em um raio de 12 quilômetros do epicentro (por sinal, a bomba explodiu sobre um hospital – mais de 90% dos médicos e enfermeiros da cidade morreram). Cerca de 100 mil pessoas desapareceram de imediato. Outras tantas morreriam nos minutos, horas e dias seguintes. Destruição, fogo, calor inimaginável, dor, sofrimento… Nunca a palavra “inferno” se mostrara tão compreensível… Hiroshima não existia mais. O Japão sofria seu golpe definitivo.

Dois dias depois, a 8 de agosto, a União Soviética declara guerra ao Império Japonês (sim, até então os soviéticos haviam se poupado de uma frente no Extremo Oriente). As Kurilas foram invadidas. E logo viria a revanche pela derrota de 1905.

O golpe de misericórdia contra o Japão ocorreria no dia 9 de agosto. Uma segunda bomba atômica seria lançada sobre Nagazaki. Mais 80 mil mortos. E a esperada rendição japonesa. O maior conflito da história da humanidade acabaria oficialmente no dia 2 de setembro de 1945, exatos seis anos e um dia após a invasão da Polônia pelos alemães.

Indubitavelmente, a Bomba de Hiroshima pôs fim à Segunda Guerra Mundial. Indubitavelmente, a Bomba de Hiroshima evitou o desembarque norte-americano no território japonês e o prolongamento da guerra por meses. Indubitavelmente, a Bomba de Hiroshima mostrou ao mundo quem tinha uma nova arma, quem dominava o átomo e quem daria as cartas a partir de então.

E entramos em uma nova era. E nunca mais poderia acontecer uma guerra como a que terminara de acabar. ninguém ousaria enfrentar aquela nação que dominava o átomo. A paz estaria duradoura assegurada… ou não…

Neste 6 de agosto, um minuto de silêncio deve ser feito em memória dos milhares de homens, mulheres e crianças que foram sacrificados para que se tivesse a paz. E hoje, sete décadas depois, na Hiroshima reconstruída, aquele povo orgulhoso celebra sua capacidade de literalmente renascer das cinzas, e de mostrar ao mundo que, no fnal, os japoneses venceram.

“Now I am become Death, the destroyer of worlds.” (Robert Oppenheimer, quoted from the Bhagavad Gita)

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