Um triste episódio…

Vamos a mais uma indicação de livro? Ainda sobre a família imperial russa…

[“Tá”, você deve estar se perguntando, “outro livro na terça? O sujeito passa dias sem publicar e agora me manda duas indicações no mesmo dia!?!” É isso mesmo. E sabe por quê? Porque eu quero. Meu site, minhas regras. A regra geral é que “toda terça haverá indicação de um livro” (pelo menos). Nada impede, portanto, que eu indique mais de um livro na terça, ou trate de livros em outros dias da semana… É só me acompanhar por aqui e aguardar as novidades…]

img_20200717_091135_872Indico hoje “Os últimos dias dos Romanov“, de Helen Rappaport, outra profunda conhecedora do último Czar da Rússia e de sua família. A obra trata, especificamente, dos 14 dias finais da vida de Nicolau II, de sua esposa Alexandra e dos filhos (Olga, Tatiana, Maria, Anastácia e ALexei), na residência de Ipatiev, em Ekaterimburg.

Li “Os últimos dias dos Romanov” há uns 15 anos, quando estava de férias no Rio Janeiro, nos chuvosos dias de Verão da capital fluminense. A narrativa é muito envolvente, e o leitor certamente terá dificuldade de interromper a leitura até chegar ao desfecho, o terrível massacre de 17 de julho de 1918.

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A descrição de como os Romanov foram executados é marcante. Só quem conhece essa história sabe o quanto sofreu aquela família, em uma execução desnecessária, pois Nicolau, que abdicara, estava fora da vida pública, deixando o poder de forma pacífica para se dedicar ao que tinha de mais precioso (muito mais precioso para ele que os 22 milhões de km2 de rico território, os 150 milhões de russos e o poder autocrático): sua família.

A decisão de assassinar o Czar, Alexandra, suas belas filhas e o pequeno e doente Alexei, foi ordenada pelo nefasto Lênin, e motivada por ódio, ressentimento, inveja e vingança. É de todo sórdida. E o trecho final da descrição do livro na contracapa resume bem significado daquele massacre:

“Seu assassinato, o início de uma orgia de terror e represálias sangrentas que caracterizaria a guerra civil russa.”

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De volta com o “Dia do Livro”

Atendendo ao clamor dos meus 16 (dezesseis) leitores, retorno aos poucos a publicar em Frumentarius. Volto, inclusive, com o “Dia do Livro” (as terças em que sempre indico livros dos mais distintos temas – sem receber “jabás” das editoras ou dos autores). Observo que já tenho feito, no meu perfil público no Instagram, cometários sobre quase quarenta livros. Farei isso aqui também para os meus leitores que não acessam o aplicativo (mas, se voce quiser acessar o meu perfil no Instagram, e me seguir por lá, agradeço muito!).

Para (re)começar, destaco que no último dia 17, relembramos a trágica morte do Czar Nicolau II e sua família (e seu médico, e dois criados), brutalmente assassinados pelos bolcheviques dos Urais, a mando do canalha Vladimir Ilyich Ulianov, que passou para a história com a alcunha de Lênin. Assim, para relembrar aquela família vítima do terror comunista, publicarei, nos próximos dias, indicações, com comentários, de livros sobre a Rússia e sobre os Romanov, e também acerca da União Soviética.

O primeiro livro que gostaria de indicar é “Os Romanov – o fim da Dinastia“, de Robert Massie.  A obra, resultante de pesquisa aprofundada, narra não só os derradeiros dias do último Czar da Rússia, mas também todo o processo pelo qual os corpos da família foram encontrados, exumados e analisados, oito décadas depois da carnificina.

Respostas são dadas, por exemplo, ao destino de Alexei e da princesa Anastácia… Teriam eles escapado? Seria a lenda de Anastácia verdadeira? Como a ciência respondeu a essa pergunta, contando com a ajuda até da família real britânica?

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O massacre dos Romanov foi um dos mais tristes episódios do século XX, e que, simbolicamente, marcou o início do massacre de milhões de seres humanos, sob o pretexto da luta de classes.

Sempre me interessei pelos Romanov. Sempre repudiei o bolchevismo e a forma como os canalhas a mando de Lênin trataram aquela família.

Com Nicolau II e seus descendentes, morria uma parte da Rússia. O destino do Czar seria compartilhado por muita gente da nobreza, da aristocracia, da burguesia, do campesinato e de quaisquer grupos que fossem considerados “inimigos de classe”.
A tragédia familiar tornou-se nacional e depois alcançou os mais distantes rincões do planeta. Que nunca mais isso volte a acontecer.

A Capital Imperial e seu Metrô (Operação Outubro Vermelho)

Quando Pedro I construiu São Petersburgo, seu objetivo era mostrar ao mundo uma Rússia moderna, a qual ele pretendia inserir no clube das potências mais avançadas de seu tempo. A nova capital seria a vitrine do maior império da terra e em nada deixaria a desejar às principais cidades europeias em termos de arquitetura e urbanismo.

Assim, o primeiro Czar a se chamar de Imperador governaria a partir de uma belíssima capital, uma cidade projetada para evidenciar a grandeza da Rússia. Indubitavelmente, Pedro teve grande êxito em seu projeto!

As primeiras impressões de São Petersburgo são de um cidade clássica. A grandiosidade da antiga capital se revela em suas largas avenidas cortadas por canais, os quais se atravessa sobre pontes que por si são obras de arte. Mesmo com as sete décadas de comunismo, a cidade conseguiu conservar as características daquela que fora uma das mais belas capitais europeias dos séculos XVIII e XIX: palácios, teatros, igrejas grandiosos…

O centro histórico está muito bem preservado... E, caminhando por ali, por exemplo, da estação de trem até o Palácio de Inverno pela Avenida Nevsky, você observará belas lojas, vitrines suntuosas, estátuas e monumentos e uma harmoniosa beleza do século XXI pós-soviético inseridos em construções que resistiram às transformações dos últimos cem anos. É, realmente, como voltar no tempo…

Na primeira manhã na Rússia, Adriana, Gustavo e eu fomos passear pela cidade. Seguimos para a estação de metrô mais próxima do hotel para comprar bilhetes de viagens ilimitadas para uma semana – essa é uma boa alternativa se você for ficar pelo menos cinco dias… Assim, poderíamos nos deslocar, como quiséssemos e o tanto que julgássemos necessário, por todo o sistema de transporte urbano.

A estação era Ploshchad Vosstaniya, muito particular em sua arquitetura, é uma das primeiras do metrô de São Petersburgo, inaugurada em 1955 e cuja profundidade é de 58 (isso, cinquenta e oito) metros! Lembre-se que o metrô deveria converter-se em abrigo antiaéreo, inclusive com uma estrutura que protegesse a população (ao menos em tese) contra ataques nucleares.

A estação Ploshchad Vosstaniya

Assim, para chegar às plataformas, você desce por uma escada rolante que parece levar às profundezas da Terra… E, o que me chamou a atenção, no final da escada há uma “guarita” com um funcionário do metrô (ali os funcionários na guarita eram todos senhoras idosas de uniforme – típicas “avós” russas) e um telefone, o que nos remete automaticamente aos tempos da URSS, onde o “guarda do metrô” deveria ficar ali para “fiscalizar” os milhares de transeuntes que usavam o sistema de transporte – achei interessante! Por óbvio, a pergunta que me fiz era se aquelas senhoras estavam ali desde os tempos de Krushev (as mesmas mulheres, claro!)…

A dica de hoje, portanto, é: vá passear de metrô em São Petersburgo. Claro, a superfície é belíssima e interessante, mas os subterrâneos têm seu charme e merecem um tempinho para que se conheça algumas estações. Mesmo não tendo a decoração suntuosa do metrô de Moscou (construído a mando de Stálin para que cada estação fosse um “palácio subterrâneo para o povo”), o metrô de São Petersburgo também tem lugares belos e inusitados, com estátuas, afrescos e pinturas, estações que merecem ser conhecidas. E o bom é que você ainda vai para onde quiser!

Naturalmente, continuarei a falar de São Petersburgo nas próximas semanas. Mas o que percebi ao chegar àquela cidade, é que estava realmente na capital da Rússia. Mas e Moscou? Moscou, eu descobriria, também fascinante, é a capital da União Soviética. Essa foi a minha sensação: mesmo enquanto foi Leningrado (e apesar disso), São Petersburgo não perdeu sua majestade!

Mais adiante falarei das impressões sobre o povo e o ambiente. Antecipo que a gente de São Petersburgo é bem diferente da gente de Moscou (achei o povo nas duas cidades atencioso e simpático, mas ficavam claras suas diferenças). Numa comparação simplória, associaria São Petersburgo ao Rio de Janeiro, e Moscou a São Paulo! A conferir…

As cortes europeias entre 1843 e 1944

IMG_20190810_194918_365Como hoje é o dia do livro, faço referência a uma interessante obra que estava a consultar dia desses… Chama-se Les Cours d’Europe – Histoire d’un Siècle, 1843-1944, e é uma publicação da Revista L’Illustration, um semanário fundado em 1843, e que marcou a França durante a Belle Époque e a primeira metade do século XX. L’Illustration foi o primeiro periódico francês a publicar uma fotografia (em 1891) e também o primeiro a publicar uma foto colorida (em 1908). Em 1957, após inúmeros problemas relacionados inclusive ao colaboracionismo de seus editores durante a Segunda Guerra Mundial, a revista foi à falência e encerrou definitivamente suas atividades.

A obra, portanto, reúne uma série de reportagens e publicadas por L’Illustration nos seus tempos áureos. Descreve um pouco da vida e da história das Casas europeias reinantes no período, dos Windsor (com uma bela foto da Rainha Victoria e três gerações de descentes que reinaram no trono britânico) à Casa dos Romanov (brutalmente executada pelos bolcheviques em julho de 1918).

O que gostei no livro foi de conhecer um pouco mais sobre os antepassados dos atuais soberanos europeus (para aqueles que acham que a monarquia é coisa do passado, lembro que entre as 10 nações mais desenvolvidas do planeta, a maioria é composta por monarquias, como o Reino Unido, a Espanha, a Suécia, a Noruega, a Holanda, a Bélgica, e o Luxemburgo, além, é claro, do Império do Sol Nascente, o Japão).

Fatos inusitados são ali narrados. Certamente, conhecer a história dessas pessoas é positivo para a causa monárquica. Dessa maneira, consegue-se entender muito do lado humano da realeza se percebe o quanto esses Casas, reinantes ou não, são nada mais que “famílias”, o que naturalmente as aproxima do povo. Quem conhece a vida de reis e príncipes modernos (de monarquias constitucionais, que fique o registro) bem sabe o quanto são pessoas simples, comprometidas com suas funções de Estado (dificílimas, por sinal), sem vida privada, patriotas e amantes de seu povo e seu país.

O livro é rico em histórias e em ilustrações, portanto. Nesse sentido, lendo sobre Dom Manuel II, de Portugal, descobri que o último monarca português nasceu exatamente no dia 15 de novembro de 1889, ou seja, na data do golpe de estado que pôs fim ao Império do Brasil. Coincidência? Não sei. Definitivamente, os Bragança nos surpreendem sempre!

George e Nicky – razões de família versus imperativos de Estado

Dia desses, quando postei em minhas páginas no Facebook e no Twitter (siga-nos lá!) sobre um livro que tratava das Casas Reais Europeias, a foto da capa causou dúvida aos leitores. Quem era o casal real ali representado? Alguns amigos pensaram que eram Nicolau II e sua esposa Alexandra, os últimos Romanov a governar a Rússia. Surpreenderam-se quando disse que não eram eles… Mas quem seriam então?

A resposta: era uma foto de George V, do Reino Unido, e de sua esposa, Vitória Maria de Teck. “Mas como? Parece tanto com o Czar Nicolau II!”. Não se preocupe, essa confusão é mais comum do que se imagina…

Confundir George V e Nicolau II não é nada de absurdo. Os dois eram primos-irmãos (a mãe de Nicolau era irmã da mãe de George), e realmente se pareciam muito. Ambos os monarcas, assim como suas esposas, eram todos descendentes da Rainha Victoria (como a maioria absoluta dos soberanos europeus, diga-se de passagem).

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De fato, George e Nicky (como o Czar era chamado pelos parentes mais próximos) gostavam de brincar com essa grande semelhança. Não eram raras as vezes em que posavam para fotos vestindo os uniformes um do outro ou propositalmente confundiam aqueles que com eles se encontravam, pregando-se-lhes peças. Note-se que o soberano russo falava inglês sem sotaque e, sobretudo quando jovem, frequentava muito a corte britânica. A Czarina Alexandra (nascida Alice), por sua vez, era uma princesa alemã, mas passara grande parte da infância no Reino Unido, tornando-se muito próxima da avó materna, a Rainha Victoria.

Portanto, os dois soberanos eram bons amigos, desde a infância. Na juventude, conviveram bastante. Uma curiosidade: chegou-se a cogitar que a princesa Alice de Hesse iria se casar com George (o que, se tivesse acontecido, faria dela a futura esposa do Rei da Inglaterra). Entretanto, Alice apaixonou-se perdidamente por outro príncipe, seu primo Nicky, e “enfrentou” a própria avó (que gostou da impetuosidade da neta) e as “razões de Estado” para se casar com o amor de sua vida. Assim, Alice celebrou o matrimônio com Nicky, que se tornou Nicolau II, da Rússia, e ela própria alterou seu nome para Alexandra Feodorovna, vindo a ser a última Czarina. O casal Romanov teve cinco filhos (as Grão-Duquesas Olga, Tatiana, Maria e Anastácia, e o Czarevich Alexei), seu amor perduraria por toda a vida e Nicolau e Alexandra seriam conhecidos como um dos casais mais apaixonados e verdadeiramente unidos entre as famílias aristocráticas de seu tempo.

Voltando a Nicolau e George, os primos, já soberanos da Rússia e do Reino Unido, respectivamente, veriam-se diante de um dos períodos mais trágicos e importantes da História: a I Guerra Mundial. Juntos, estariam à frente de seus Estados contra a Alemanha, na qual reinava seu outro primo, Guilherme II, também neto direto da Rainha Victoria. E a forma como lidaram com a dicotomia “razão de Estado” versus “razões de família” selaria o imbricado futuro de ambos e o destino de suas famílias e de seus tronos.

Não é exagero dizer que a Grande Guerra foi um conflito entre irmãos. Como consequência daqueles anos de morte, sofrimento e destruição, o Império Alemão ruiria, e Guilherme II se exilaria na Holanda, onde ficaria até o fim da vida, na década de 1940. George continuaria soberano do Reino Unido, país vitorioso da I Guerra Mundial, mas cuja decadência das décadas seguintes já dava os primeiros sinais. Quanto a Nicky, seria tragado pelos acontecimentos que o levariam à abdicação e consequente fim da monarquia na Rússia e dos trezentos anos de autocracia dos Romanov. Seu fim e o de sua amada família constituiriam um dos mais trágicos acontecimentos do século que se iniciava.

Após a abdicação, Nicolau Romanov, Alexandra e os filhos ficaram sob custódia do Governo Provisório. Visto como uma ameaça por aqueles que temiam a restauração monárquica, o antigo Soberano de Todas as Rússias tornou-se uma peça importante no tabuleiro político interno e seu destino uma questão de cunho internacional. Sua integridade e a de sua família estariam ameaçadas se permanecessem na Rússia, apesar das garantias do Governo Provisório de que ninguém tocaria no ex-Czar e nos seus. Começaram as negociações para que os Romanov partissem para o exílio, tendo como principal destino o Reino Unido. E aí começa o drama que mostrou a fraqueza de George e sua conduta reprovável, mas também a sua submissão às “razões de Estado” e a preocupação com a preservação da monarquia britânica.

Imediatamente após a abdicação, na primavera de 1917, o Governo Britânico chegou a oferecer asilo para o Czar e sua família. A pedido do Rei George, o Embaixador britânico em Petrogrado, George Buchanan, apresentou formalmente a oferta do Governo de Sua Majestade de abrigo para os Romanov no Reino Unido.

Entretanto, enquanto seguiam as negociações sobre o destino de Nicolau e família, aumentava a pressão do Gabinete de Sua Majestade contra o abrigo aos Romanov em solo britânico – o próprio Lloyd George, Premier do Reino Unido, era contrário a receber o “tirano” Nicolau em seu país de tradição liberal e democrática. A reação negativa da opinião pública crescia a cada dia, e havia argumentos de que a vinda dos Romanov para a Inglaterra poderia por em questão até a própria monarquia britânica.

George teve então que decidir sobre a acolhida de seus primos. Se as razões de sangue faziam-lhe querer ter seus familiares consigo, e garantir-lhes a segurança, os imperativos de Estado (ao menos era o que argumentavam os políticos) o impeliam a voltar atrás na proposta de asilo.

O monarca britânico decidiu. Aquela deve ter sido a mais difícil resolução de sua vida – como o fora a abdicação do primo Nicolau, alguns dias antes. Cedeu ao apelo dos políticos e lavou as mãos quanto ao destino de Nicky e sua família. Londres ordenou a Buchanan que voltasse atrás na oferta de asilo. E assim foi feito.

Tendo seu primo inglês dado-lhe as costas, Nicolau viu sua situação agravada nos meses seguintes. Tornou-se verdadeiro cativo do Governo Provisório. Com o golpe bolchevique de outubro de 1917, a desgraça se abateria definitivamente sobre aquela bela família. Levados como prisioneiros para a Sibéria, transportados às pressas de uma cidade a outra, em condições cada vez mais complexas e difíceis, Nicolau, Alexandra e os filhos enfrentariam seu trágico destino em julho de 1918, massacrados pelos algozes bolcheviques a mando do próprio Lênin. Triste fim para o último Czar.

Sempre me pergunto se a decisão de Nicolau em abdicar foi a mais acertada. Mesmo com sua situação como soberano tremendamente complicada, será que não deveria ter continuado no trono, e sido mais resoluto no trato dos problemas de Estado? Será que deveria ter escutado menos a sua amada Alexandra? Indiscutivelmente, a decisão de abdicar teve como fator preponderante a família: Nicolau sabia que Alexei, com sua hemofilia grave, jamais poderia se tornar o Czar. E acreditava sinceramente que, sem as responsabilidades de um monarca autocrático, poderia se dedicar plenamente a sua família e cuidar de maneira mais efetiva de seu filho doente. Abdicou em favor de seu irmão Mikhail, sem consultá-lo. E Mikhail, ele próprio, não quis o fardo de soberano, o que agravou a crise e provocou a queda da monarquia e o fim da dinastia dos Romanov à frente da Rússia.

George, por sua vez, optou pelos imperativos de Estado – os quais, certamente, também envolviam a preservação do trono. Difícil não associar a decisão abnegada de George V (que também, repito, pode ser entendida como submissão disciplinada e razoável aos interesses de Estado) ao triste destino dos Romanov (sobre o qual também a hesitação de Nicolau, especialmente no contexto de sua abdicação, teve forte influência). Se o Rei tivesse sido mais assertivo com seus ministros, ao menos a Czarina e as crianças poderiam ter sido salvas. Assim, a morte dos primos russos seria realmente indissociável da conduta claudicante do soberano britânico.

Por certo, George nunca se perdoou pelo que aconteceu a Nicolau, Alexandra e sua família. Nunca mais foi o mesmo depois daquilo. E levou para o túmulo a culpa, que, na verdade, era em parte do hesitante Nicky e dos facínoras bolcheviques, cujo ódio e a sofreguidão colocaram a Rússia no caos e conduziram o país a sete décadas de regime autoritário.

A história de George e Nicky é mais um drama entre os grandes dramas relacionados a um mundo romântico que desapareceu com a Guerra de 1914-1918. Passaram-se cem anos, mas essas histórias ainda nos comovem, marcam e emocionam. 

Leningrado (Operação Outubro Vermelho)

depositphotos_107401748-stock-photo-saint-petersburg-on-the-mapTudo pronto para o início da primeira fase da Operação Outubro Vermelho! Desembarcaria em Lening…, em São Petersburgo!  O mais natural seria chegar à Rússia por Moscou, mas nosso planejamento envolvia ingressar no país por sua antiga capital, e que fora o epicentro da queda da monarquia e do golpe bolchevique de outubro de 1917.

Inconscientemente, via-me indo para Leningrado. Afinal, esse era o nome que conhecia desde a infância, época em que a humanidade se dividia entre o bloco socialista (comunista, para ser mais preciso), dirigido pela União Soviética, e o mundo livre (nós!), liderado pelos Estados Unidos. Para mim, portanto, aquela bela cidade banhada pelo Rio Neva ainda estava registrada em minha mente como Leningrado, “a cidade de Lênin” – só indo lá mesmo para alterar essa percepção!

Fundada em 1703, por Pedro I, o Grande, como parte do processo de “ocidentalização” da Rússia, São Petersburgo seria a capital do Império dos Czares até 1918 (os bolcheviques transferiram a capital para Moscou temendo a ofensiva alemã, em março daquele ano – vale lembrar que ainda estava em curso a Grande Guerra). De fato, seu aspecto ocidental – que em nada deixa a desejar às mais belas cidades da Itália, França ou Alemanha – seria a forte marca da “Capital do Norte”.

No que concerne ao nome da cidade, com a Grande Guerra, em 1914, o Czar decidiu mudar para Petrogrado (denominação mais “russa” – “grad” é um termo tradicional no idioma para “cidade”). Em 1924, após a morte do facínora que liderou a insurgência bolchevique, Petrogrado recebeu novo nome, Leningrado. Com o fim da União Soviética, em 1991, a cidade voltou a chamar-se São Petersburgo. Curiosidades: o aeroporto ainda mantém o código IATA como “LED”; e a cidade está no Oblast (nome das divisões administrativas, algo como província ou estado federado) de Leningrado.

Mas vamos à Operação Outubro Vermelho! Decolei de Brasília para Guarulhos (SP) – pois a capital federal do Brasil tem menos de meia dúzia de voos com destinos internacionais -, onde encontrei Adriana e Gustavo.  Ali no aeroporto, gosto de comer no Olive Garden, que fica bem perto do embarque internacional (a comida é boa, pode-se passar o tempo, e o preço… preço de aeroporto, né? Prepare-se…). Nossa conexão foi por Londres e chegamos a São Petersburgo (LED) no final da tarde!

Tentemos descrever a emoção! Pisando em solo sov…, russo! Que bacana! Íamos conhecer a Terra dos Czares! O coração acelera. Viagem longa… cansado… Mas estava lá! E que bacana ver tudo escrito em russo! E os avisos em cirílico! Sim, estávamos mesmo na Rússia!

Fui tenso para a imigração (sempre fico tenso na imigração, pois a maior autoridade do universo é o oficial de imigração! Se ele encrencar com você, pode até não deixar que entre no país, mandá-lo de volta ou mantê-lo detido por horas!).  Como seria na Rússia? Lembro que, no passado, a guarda de fronteira ficava a cargo do KGB, e que nem todo lugar é como no Canadá, onde o oficial de imigração lhe recebe com um sorriso, um bom dia e um “bem-vindo ao Canadá!” – isso quando, com uma simpatia sincera, não lhe pergunta sobre o Brasil, como está a situação política e a economia (asseguro que já aconteceu comigo, e é por isso que gosto demais do Canadá!)…

Procedimentos de imigração rápidos e descomplicados, tanto para mim quanto para Gustavo e Adriana, que passaram por outro guichê. Troquei com o guarda de fronteira duas ou três palavras antes do carimbo no meu passaporte. A Rússia já me acolhia bem! E isso era um ótimo sinal! Primeira etapa (imigração) concluída sem problemas!

Já com as malas em mãos (tudo certo também), saímos e lá no portão já estava nosso receptivo! (Excelente serviço contratado pela Tchayka!). Entramos os três em uma van. Já estava um pouco frio (lembre-se de levar gorro, luvas, cachecol e casacão – você vai precisar). E seguimos para o hotel, tendo as primeiras impressões da segunda maior cidade do maior país do mundo. Nos arredores, muitos prédios ao estilo soviético – com o qual estou familiarizado por viver em Brasília. Parecia uma viagem no tempo, e eu ficava imaginando quem seriam as pessoas que moravam naqueles blocos de apartamentos dos anos sessenta, como viviam, qual seria sua história… Gosto de gente, e as histórias de gente me fascinam!

Chegando ao hotel, outra grata surpresa: localização excelente! Nosso hotel, o Park Inn by Radisson, está em na Avenida Nevsky, provavelmente a mais importante (ou pelo menos uma das mais históricas) da cidade! Fica defronte a Moskovsky Vokzal (a estação de onde, como diz o próprio nome, partem os trens para Moscou – só por curiosidade, nos tempos pré-soviéticos, a estação se chamava Nikolaevsky, em homenagem ao Czar Nicolau I).

Se a localização é excelente para quem gosta de caminhar (muita coisa pode, e deve, ser feita a pé em São Petersburgo), o Park Inn também é próximo à estação do metrô. Trata-se de um hotel moderno com excelentes quartos – eu gostei. Recepção simpática, mesmo quando pedem seu passaporte para fazer uma cópia de algumas páginas – não estranhe, é assim mesmo na Rússia, por razões de segurança; só recomendo que você espere até que o recepcionista lhe devolva o passaporte em vez de deixar para pegar depois (eu faço assim, separo-me o mínimo possível de meu passaporte).

Outro ponto forte do Park Inn: o restaurante é um restaurante típico de comida… alemã! Isso mesmo! É o Paulaner Restaurant, onde servem também um café da manhã dos melhores que já experimentei. Enfim, a escolha da Tchayka para a hospedagem em São Petersburgo foi nota dez! E só seria superada pela do hotel em Moscou (sobre o qual falarei em outro post)!

Devidamente alojados, fomos descansar… Que nada! Descansar é para os fracos! Fomos é explorar o entorno! Sempre faço isso, e Adriana e Gustavo, como excelente companhia que são, foram juntos na etapa do reconhecimento!

Cidade linda! Lembra muito as ruas Paris, só que banhadas por canais (já chamaram São Petersburgo de Veneza do Oriente). Prédios no estilo neoclássico, com poucos andares… a gente se sente rapidamente voltando no tempo, e começa a imaginar como era aquela bela cidade na virada do século XIX para o XX! Na Avenida Nevsky, muitas lojas, casas de câmbio e bancos – ali andamos um pouco, comparando os preços, e acabamos trocando nossos dólares por rublos em um banco (no final do dia!). Depois, fomos comprar um cartão pré-pago, também na Nevsky, para ter acesso à internet.

20171031_193539Já disse aqui que a internet e a telefonia em geral na Rússia são baratas. Graças às dicas da Olga, pagamos cerca de 450 rublos (uns 25 reais) por internet ilimitada e 60 minutos (acho) de ligação local para duas semanas! E, repito, funcionou que foi uma beleza! Afinal, o país tem uma enorme cobertura satelital, investe em ciência e tecnologia, e as comunicações são ótimas – se o Governo sabe de tudo o que você está fazendo graças àquele chip, isso não é problema meu… ao menos funciona (ao contrário de outros lugares). E fomos bater perna!

Caminhamos na noite de São Petersburgo! Pela Avenida Nevsky, muitas lojas, prédios belíssimos, luzes em toda parte! Já começava a decoração de Natal, o que fazia ainda mais bonita aquela que era a grande rua do comércio desde os tempos dos czares! Quanta coisa não tinha acontecido ali! Quantos episódios marcantes aqueles prédios não haviam testemunhado!  De passeios matinais da aristocracia russa da belle époque às passeatas de protesto contra o governo e aos combates entre forças do czar e os revoltosos, passando pela terrível fome do inverno de 1918, pelo colapso da cidade nos 1000 dias do cerco de Leningrado durante a Segunda Mundial e chegando-se à transformação da cidade com o fim do comunismo! Muita história, muita vida! E caminhamos, caminhamos, caminhamos!

Paramos em uma lojinha de souvenires (como tantas outras que há ali) e então, outra surpresa: atendeu-nos, em um português quase perfeito, Kristina Rafaelovna, uma jovem russa, bonita, simpática e apaixonada pelo Brasil! Conversamos muito, sempre impressionados com seu excelente português. No final, compramos alguns presentes e Kristina nos indicou um restaurante georgiano, o ChaCha! E assim lá fomos para nossa primeira refeição em solo russo! E foi espetacular!

20171031_202943.jpgVoltamos para casa contentes e satisfeitos, bem alimentados, com fotos tiradas, goiabas na bolsa (“goiaba” é meu nome carinhoso para essas lembrancinhas), e realizados com nossas primeiras horas naquela maravilhosa cidade! Claro, antes de voltar para o hotel, descobri minha primeira livraria na Rússia! Mas isso será tratado no post da próxima quinta…

Na próxima semana, também vou contar mais sobre o ChaCha, e sobre como foi a experiência de testar minhas habilidades em russo no restaurante. Até lá!

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Operação Outubro Vermelho – Preparativos

Fundamental antes de qualquer viagem é a preparação. No caso de um destino como a Rússia, essa preparação adquire mais relevância, sobretudo porque, no meu caso, chegaria alguns dias antes e partiria depois que a excursão acabasse – ou seja, estaria entregue a minha própria sorte…

A preparação envolve conhecer um pouco sobre o destino, tanto no que concerne ao país que será visitado, como às cidades e, ainda, ao povo e à cultura local. Nesse sentido, começo usualmente por mapas (da Rússia, de São Petersburgo e de Moscou). Gosto de mapas e atlas e ali identifico onde ficarei e assinalo para onde quero ir, tendo feito uma pesquisa prévia sobre os lugares, horário de funcionamento, custo da entrada e, sempre bom lembrar, distâncias entre eles e meios de deslocamento. (Claro que você pode deixar isso tudo para sua agência de viagens, mas confesso que gosto muito de fazer isso por minha conta – é bem mais divertido, e você já começa a aprender com a viagem antes mesmo de sair de casa!)

A Rússia é o maior país do mundo em extensão territorial (são 17 milhões de km2, ocupando dois continentes), com uma população de 142 milhões de seres humanos de diferentes etnias (além dos russos, que constituem 81% da população, há ainda cerca de 160 grupos étnicos), que falam aproximadamente 100 línguas de distintos ramos (do abaza, com seu alfabeto de 71 letras – das quais apenas 6 vogais -, ao idioma falado pelo povo esquimó de Tchukotka – com singelas 63 formas verbais). Felizmente (?), o russo é a língua franca (dedicarei um post aqui à “barreira do idioma”).

IMG_20171113_211806_116jpg.0A terra dos russos tem uma história interessantíssima, desde os primeiros eslavos que ali se estabeleceram no século IX até a Era Putin (gosto de Putin; Putin é KGB), passando pelos 300 anos de autocracia dos Romanov (meus 16 leitores sabem da minha estima pelos Romanov) e pelas sete décadas de regime soviético, iniciado a partir da nefasta Revolução Bolchevique de 1917… Ademais, a Rússia é uma potência econômica (sim, gostem ou não, o país está no time de elite das Economias do planeta), nuclear (preserva o poder militar que herdou da URSS e o usa com sabedoria), e espacial (essa parte é importante para entender alguns de nossos posts futuros)…

Eu poderia dedicar várias páginas aqui a falar da Rússia… Entretanto, acabaria fugindo do tema desta publicação específica (se você quiser saber mais, pesquise, oras!). Mas o que cabe destacar é que eu estava ansioso e temeroso de desembarcar naquelas terras! Afinal, o mais próximo que havia ido a Leste havia sido a Estônia (que merecerá vários posts na categoria de viagens, por certo!), e já quando esse pequeno país do Báltico estava na União Européia e na OTAN. Como seria a chegada? E no aeroporto? Será que teria um receptivo para me transportar (junto com Adriana e Gustavo) ao hotel? E a hospedagem, como seria? (Localização de hotel é essencial, assim como condições mínimas de estadia.) Felizmente, essa logística inicial ficou por conta da Tchayka, missão cumprida com louvor!

Visto: para o brasileiro que vá a turismo à Rússia, não é mais necessário visto (agradeçam a Putin). Antigamente, nos tempos soviéticos, dizem que se precisava de um convite de alguém ou de alguma instituição para se solicitar o visto – naturalmente, isso era uma forma de o Estado controlar os estrangeiros que entrariam em seu território (e, só por curiosidade, o órgão responsável pelo controle de fronteiras era… o KGB! O serviço de inteligência teria chegado a possuir 400 mil homens cuidando das fronteiras soviéticas). Atualmente, repito, não lhe será necessário o visto – que exigirão de norte-americanos e europeus em geral, hehehe.

E o idioma? Teremos um post específico a respeito. Gosto de chegar a um lugar onde consiga me defender minimamente na língua local, mas o mundo é muito grande e a diversidade linguística torna isso impossível. Como disse, não morrerei de fome em russo, sei pedir desconto (скидка, ensinou-me Olga, minha professora de russo) e consigo pegar informação e comprar bilhetes de metrô, o que me deixa em vantagem quando naqueles lados. Mas se você não fala russo, não entre em pânico! Dou-lhe três opções: 1) fale inglês ou espanhol e entregue o diálogo ao Grande Arquiteto do Universo que ele lhe ajuda!; 2) Gestos – certamente, se você já jogou imagem e ação, vai se virar bem; 3) confie na agência de viagens especializada e deixe com eles a tarefa de se comunicar por você (recomendo alternativa 3, sobretudo se você for para lugares que estejam fora dos destinos turísticos clássicos) – gosto dessa terceira opção se não conhecer bem a língua, a cultura e o povo do lugar aonde pretendo ir.

20171031_193711.jpgAinda sobre o idioma, lembrei de uma quarta possibilidade de comunicação! Tenho um amigo de Minas Gerais (falam português lá também, adoro Minas!), que é muito comunicativo, e que me disse que, algumas vezes, inclusive na Rússia, em que não conseguiu falar o inglês, resolveu falar mesmo em português com os nativos! E, nas palavras dele, a coisa funcionava e ele conseguia se fazer entender (nunca tentei isso, mas se você quiser arriscar…)! E essa história me fez lembrar de outro amigo, que viajou certa feita com a esposa e a sogra para Paris e a genitora de sua esposa se perdeu… Após muito procurar, ele ouviu uma senhora no meio da rua, falando alto e pausadamente (e com o inconfundível sotaque pernambucano) aos transeuntes: “Es-tou per-DI-DA! Sou bra-si-lei-ra e es-tou per-DI-DA! Al-guém me a-ju-DE!” O fato é que ela conseguiu ser encontrada e ganhou nota dez em efetividade!

Melhor época do ano para ir à Rússia? Todo mundo vai dizer que é no verão (ou em maio, ou em setembro) … Deve ser mesmo, mas eu queria ir em novembro, para sentir como seria o clima do país no mês do golpe bolchevique que acontecera cem anos antes. Aí você me pergunta: não seria outubro? Até 1918, os russos adotavam o Calendário Juliano, enquanto nós aqui no Ocidente já estávamos, desde 1582, sob o Calendário Gregoriano, havendo uma diferença atualmente de 13 dias entre ambos. Assim, o levante bolchevique, ocorrido em outubro de 1917 para os russos, deu-se, no nosso calendário, em novembro. De toda maneira, o clima estaria bem frio para meus padrões tupiniquins…

Com que roupa eu vou? Sendo férias, roupas confortáveis. Costumo me programar para levar uma muda por dia, mais duas mudas extras e algumas peças caso vá sair para algum restaurante mais arrumado à noite ou coisa parecida. No caso de camisetas, vale lembrar que você pode levar um pouco menos, adquirir algumas no local onde estiver e já sair vestido nelas (o que lhe garantirá mais espaço na mala). Outro detalhe importante: quando para destinos frios, você necessitará de um ou dois casacos simples (tipo pulôver), que ficarão sob o casacão de inverno (esse é meu coringa!) – e saiba que passará a viagem toda com esse casacão (mande às favas quem quiser acusá-lo de repetir a roupa – você está de férias, no frio, e tem que ser prático). Duas calças: uma mais arrumada e aquela superprática com um monte de bolsos! E, para o frio russo, cachecol, gorro, luvas e malha interna (mão na roda!). No máximo dois pares de calçados (eu gosto de usar uma bota que me acompanha em diferentes ambientes). Os limites de peso de mala das companhias aéreas não ultrapassam uma peça de 23 kg, então seja comedido (e deixe espaço para as “goiabas” que comprará na viagem). E se for pegar trem, a coisa é mais restrita, com a ressalva de que será você mesmo quem carregará a mala para dentro e fora do vagão…

Ainda sobre as malas, lembre-se de tirar uma foto de sua bagagem antes de despachá-la (e de guardar com muito carinho o comprovante). Também recomendo fazer uma etiqueta para colocar dentro, com informações sobre seus voos, endereços do primeiro destino e de casa, e informações de contato. Coloque, repito, dentro da mala, sobre as roupas (eu faço assim). A ideia é mitigar o risco de extravio e, caso isso aconteça, ajudar a companhia aérea a lhe devolver a bagagem…

Dinheiro e câmbio: difícil encontrar rublos no Brasil, então você vai trocá-los lá. Evite trocar muito dinheiro no aeroporto, pois a taxa de câmbio é bem desfavorável em qualquer aeroporto da Via Láctea. Em São Petersburgo e em Moscou há bancos por todo lado (cheguei ao hotel, fui fazer o reconhecimento do ambiente operacional – procedimento padrão, e vi que havia muitos bancos e casas de câmbio, podendo escolher a melhor cotação). Não preciso dizer para você não trocar dinheiro na rua com estranhos, né? Nos hotéis costumam trocar, mas você sofrerá com o câmbio.

Comunicações: sem comunicação (leia, internet) você estará em situação bastante desfavorável. A boa notícia, quem me deu foi a Olga (a mesma que me ensinou, entre outras coisas, a pedir desconto), é que internet na Rússia é barata e você pode comprar um cartão telefônico pré-pago que lhe será tremendamente útil. Fiquei surpreso com o baixo custo da internet (muito inferior à Europa e aos EUA). E, melhor de tudo, a internet funcionava que era uma beleza! Depois, pensando a respeito, entendi a importância de se ter um setor espacial desenvolvido como o russo. Isso afeta diretamente o custo das comunicações do dia-a-dia. Fica a dica para um melhor aproveitamento do Centro de Lançamento de Alcântara (CTA) e para investimentos maciços no programa espacial brasileiro!

Passaporte em dia, mapas em mãos, com locais de interesse assinalados, dinheiro no bolso, seguro de viagem feito (faço sempre com a Cleide e a equipe da Adria Viagens – também não estou recebendo jabá deles não, mas há muitos anos trabalho com esse pessoal muito profissional aqui em Brasília e que acabou se tornando amigo – recomendo!), mala arrumada, história na cabeça, coração acelerado, expressões no idioma local memorizadas, entusiasmo de conhecer o novo, um outro mundo, a Terra dos Romanov! Sentia-me como César ao cruzar o Rubicão: logo eu cruzaria ao Atlântico e chegaria a um dos países mais fascinantes em que já estive! E vamos à Rússia!

Saí de Brasília para a conexão em Guarulhos, onde encontraria Gustavo e Adriana. Depois seria Londres e aí Lening…, São Petersburgo! Estávamos prontos para chegar em mais uma aventura, na Operação Outubro Vermelho!

Na próxima quinta, contarei um pouco sobre São Petersburgo, a cidade fundada por Pedro, o Grande, e capital da Rússia entre 1712 e 1918! Até lá!

brasil russia

A volta dos Romanov

Conversando hoje pela manhã com um dos meus estimados 15 (quinze) leitores, esse amigo comentou sobre o interesse de sua filha e de alguns colegas lá no trabalho sobre a história da família Romanov (que governou a Rússia durante pouco mais de 300 anos), particularmente sobre o último Czar, Nicolau II, brutalmente assassinado junto com sua família há 101 anos. Coincidentemente, vi na Gazeta Russa agora há pouco uma matéria a respeito do aumento do interesse dos russos na monarquia. 

De fato, o artigo assinala que Nicolau II é mais popular entre seus compatriotas que Lênin e Stálin, e  que 8% dos russos querem o retorno da monarquia; 19% não são contra, mas depende de quem seria coroado, e 66% dos russos são categoricamente contra o retorno do regime monárquico – o que não surpreende, depois de 70 anos de comunismo e três décadas de recuperação daquele estrago… Mas esses 27% simpáticos à causa monárquica chamaram-me a atenção para um fato: os Romanov não foram totalmente aniquilados!

Niclau e Alexei

O Czar e seu filho, Alexei, também brutalmente executado em 17 de julho de 1918, pouco antes de completar 14 anos.

Ainda que a volta da monarquia no país com maior dimensão territorial do planeta seja uma possibilidade muito remota, a Rússia pós-soviética é marcada pela reabilitação do último Czar (que acabou canonizado em 2000 pela Igreja Ortodoxa), e pelo aumento do debate sobre o período imperial e a tragédia que foram os anos sob o comunismo. São poucos os que têm saudade da URSS (constatei isso quando estive no país em 2017 e nas conversas com os nativos), e muita gente vê os Romanov com um misto de curiosidade e simpatia.

Joanisval e Nicolau

O Czar Nicolau II e eu. E tem um mala discursando lá atrás…

Em novembro de 2017, na cidade de São Petersburgo, a capital fundada por um dos maiores Romanov, Pedro I, pude participar da Festa da Luz, um evento ao ar livre em que se projetavam imagens da história do país como referência aos acontecimentos de 1917, no novo feriado russo chamado Dia da Unidade Nacional (já que não se comemora mais a revolução bolchevique). A apresentação mostrava o amor de Nicolau por Alexandra, seu zelo para com os filhos, a beleza da Rússia monárquica, a Grande Guerra e crise que culminou na abdicação do Czar e no Governo Provisório, sucedido pelas conspirações que levaram ao “golpe de outubro”, que é como os russos passaram a chamar o que muitos por aqui ainda denominam saudosamente (ao estilo Neymar, “saudade do que nunca vivemos”) de “revolução russa de 1917”. Sim, parece geral a percepção de que o governo bolchevique conduzido pelo famigerado Vladimir Ilyich Ulyanov et caterva trouxe grandes males e muito mais prejuízos à Rússia e ao seu povo que benefícios, entre eles o totalitarismo stalinista. Confesso que isso muito me alegrou.

Assim, Nicolau II e sua família repousam hoje na Catedral de São Pedro e São Paulo, na antiga capital imperial, e sua memória é cultuada por pessoas das mais distintas origens e classes sociais. Como acontece nas monarquias, de ontem e de hoje, as figuras do soberano e de seus familiares, os símbolos e tradições do império, e a ideia de uma época mais charmosa e feliz permeiam o imaginário de muitos russos quando se fala “nos tempos do Czar” – tempos esses, repito, não vividos por praticamente mais ninguém ali depois de um século.

Se os Romanov voltarão um dia a governar aquele fascinante país, ou mesmo se a Rússia terá novamente um regime monárquico, é muito difícil dizer. Entretanto, o que parece uma certeza é que os russos não querem mais nem cogitar o retorno do comunismo, que se dissolveu há quase trinta anos, apodrecido nas suas ideologias de corrupção, cupidez e violência…

Nicolau e Joanisval

Joanisval e Nicolau

Compartilho aqui com meus leitores um episódio que aconteceu comigo enquanto visitava São Petersburgo por ocasião do centenário dos acontecimentos de outubro/novembro de 1917… Estava eu com um grupo de brasileiros, que haviam ido à Rússia para “comemorar a Revolução de Russa e a vitória do comunismo”. Minha curiosidade, registre-se bem, era eminentemente histórica – afinal, queria vivenciar a Rússia cem anos depois daqueles episódios que lançaram o país no caos!

Não preciso dizer que a maioria do grupo era de esquerda, comunistas e socialistas brasileiros – deveriam ser os únicos que estavam ali a glorificar os feitos do senhor Lênin et caterva. Também não preciso dizer que meu relacionamento com uma parte deles restringia-se apenas à convivência em alguns passeios e a um formal “bom dia” ou “boa tarde” quando nos encontrávamos (pois Dona Conceição me educou bem). Ao contrário das pessoas com quem estive na Normandia, em 2014, nos 70 anos do Dia D (que se tornaram bons amigos, com quem me relaciono até hoje, inclusive por conversas diárias nas redes sociais), daqueles de Leningrado (ops!) e Moscou foram poucos de quem mesmo guardei os nomes…

Mas vamos ao episódio. Estávamos a visitar o Cruzador Aurora, que, em outubro de 1917, teria dado os primeiros tiros para desencadear o golpe bolchevique e a derrubada do Governo Provisório de Kerenski. Fundeado às margens do Rio Neva, na belíssima São Petersburgo, esse navio é hoje um museu em memória da Revolução Russa. Costumeiramente, viajo com uma Bandeira Imperial do Brasil e gosto de fazer retratos com nosso Pavilhão Auriverde. Qual não foi minha surpresa ao ver que um dos nossos colegas de excursão teve a brilhante ideia de levar consigo uma bandeira soviética (sim, a tradicional, vermelha com a foice e o martelo), e quis posar para uma foto com ela no navio!

Fiquei a observar. Quando o sujeito abriu a bandeira, um marinheiro que fazia guarda ali veio em sua direção. O brasileiro achou que o rapaz iria posar com ele (como o fizeram muitos dos russos conosco naqueles dias, numa demonstração cristalina de que são um povo simpático, agradável e nada frio). Vejo os dois tentanto um diálogo impossível. Seguem-se os minutos. O cidadão fica bravo com o marinheiro. O jovem russo mostra-se irredutível nas suas determinações. A bandeira é então colada de volta na mochila, sem que o retrato fosse tirado (eu e um casal amigo tiramos várias fotos com bandeiras no navio…).

Pouco tempo depois, nosso comunista tupiniquim vem em minha direção. Foi creio que a segunda das duas vezes que troquei algumas palavras com ele em dez dias. Olha para mim, com ar frustrado, e balbucia, esperando minha solidariedade (de classe, certamente):

– Acredita que “o soldadinho ali” não me deixou tirar foto com a bandeira? Para você ver, tem “coxinha” em tudo que é lugar!

Ao que minha resposta é automática:

– Não é isso, meu caro. É que aqui eles viveram o comunismo, e têm plena consciência dos males que os comunistas causaram a este país e a seu povo!

O sujeito fica estático cinco segundos (certamente processando a resposta em sua mente patológica), dá meia-volta e vai embora rangendo os dentes (para minha satisfação, não nos falamos mais por toda a viagem). E eu fiquei ali, apreciando a paisagem do Neva já em congelamento, sentindo a brisa fria no rosto, e gargalhando interiormente, lembrando de Nicolau II e feliz comigo mesmo por ter dado minha parcela de contribuição ao povo russo em sua revisão da História e, claro, na reabilitação dos Romanov…

Para a reportagem sobre a percepção russa acerca de Nicolau II, clique aqui (e sim, está em português).

E a seguir um vídeo com um pouco da Festa da Luz, que gravei em 2017. Está também lá no meu canal no Youtube, que você acessa clicando aqui

Em tempo: a agência de turismo que me levou à Rússia foi a Tchayka (hoje operando sob o nome de Rota da Seda). Recomendo muito! Profissionalismo, seriedade e eficiência. Para acessar o site deles, clique aqui. E recomendo falar com o Sérgio Delduque lá – certeza de bom atendimento!

(Atenção! Não estou ganhando nem um centavo de jabá do pessoal da Tchayka. Recomendo porque realmente gostei muito do serviço deles!)

Data triste, há 101 anos…

Na madrugada de 17 de julho de 1918 ocorria um dos episódios mais nefastos do século XX e da História da Rússia: em Ekaterinburgo, nos Urais, o Czar Nicolau II, sua bela família e mais quatro pessoas que acompanhavam o último Imperador da Rússia no exílio, foram brutalmente assassinados por revolucionários bolcheviques a mando do facínora Lênin.
Não cabe aqui assinalar o quão deploráveis foram aqueles acontecimentos, nem a maneira como as vítimas foram arrancadas de duas camas e massacrados a sangue frio em nome da Revolução.
A data de hoje é para lembrar da tragédia dos Romanov e orar pelas suas almas.
E que o comunismo desapareça da História, pois só trouxe dor, tristeza e sofrimento a milhões de seres humanos…

400 anos dos Romanov

RomanovAproveitando o momento imperial, registro aqui a bela exposição no site da RiaNovosti em comemoração aos 400 anos da Dinastia Romanov. São fotos interessantes do último Czar e sua família, dos festejos ocorridos em 1913 por ocasião dos 300 anos daquela Casa e de artigos que pertenceram à família imperial, como a primeira carta do Príncipe Coroado Alexei a seu amado pai Nicolau II. Recomendo aos interessados pelo tema.

Para acessar a exposição, clique aqui.